19.10.15

Um tempo certo ?

 
Uma muito conhecida campanha publicitária, de há uns anos, proclamava que “o tempo é o que dele fazemos (…)”. Vários sentidos se podem extraír da ideia, parecendo-nos que sobressai, desde logo, o conceito de relatividade inerente ao uso que fazemos do tempo. Quer-se, pois, sublinhar que a noção do tempo, do seu curso, é diferente para cada um de nós e, isso, parece depender do nosso interesse, entusiasmo, empenho, nas ocorrências a que somos sujeitos ou promovemos ao longo da vida.

Vimos defendendo, há muitos anos, a adopção de algumas regras básicas de conduta para aquilo que hoje se denomina “credibilidade” da actividade política. No fundo, para que a acção política não se transforme numa carreira, num emprego, num “tacho”, numa usurpação ilegítima.

Acreditamos que a política é uma actividade nobre, honrosa e de serviço público. É uma actividade que requer a participação de todos e não a profissionalização de alguns com exclusão de todos os outros. Donde, a participação na actividade política talvez deva ter um tempo limitado, um tempo certo.

Advogamos (já o preconizávamos antes de alguns mandatos terem sido limitados por lei) que os eleitos locais ou os deputados da nação não deveriam permanecer em funções para além de três mandatos consecutivos. Doze anos são suficientes para evidenciar ao que se vem e que capacidade se tem de executar e/ou liderar os projectos em nome dos quais se foi eleito. Passado esse tempo em funções, o período de nojo, deveria ser idêntico, admitindo-se então um regresso, caso fosse essa a vontade de eleito e eleitores.

É abrir a participação política a mais cidadãos e obstar a esquemas intra-partidários, compadrios, fidelidades serôdias, dependências e, porque não dizê-lo, à pequena e grande corrupção. No fundo é velar pela autenticidade e envolvimento desinteressado.

Segundo a visão que temos, a actividade política deveria ser bem remunerada (e garantido o regresso, sem prejuízo profissional, ao posto de trabalho de onde se saiu), tendo como contrapartida uma forte responsabilização pelas decisões políticas tomadas (sujeitas a análise por um painel de eleitores seleccionados pelo tribunal da comarca no termo do exercício de funções) e com um largo período (12 anos também ?) sem prescrição para potenciais ilícitos, que viessem a revelar-se. 

Tais regras, deveriam ser, antes de mais, plasmadas em lei de valor reforçado, nos aspectos não temporais e adoptadas voluntariamente por eleitos e forças políticas, no que concerne ao tempo máximo consecutivo do exercício de mandatos electivos.

Reconhece-se que os políticos não são todos iguais, tal como se reconhece que há gente muito capaz, dedicada, empenhada e persistentemente inovadora, que bem poderia levar a sua acção política por décadas sem esmorecer ou cair em tentações de proveito próprio da sua condição de eleito, mas só a generalização da regra pode assegurar a sua credibilidade e consistência.

Temos, portanto, a convicção que a regeneração e prestígio da actividade política é possível, com uma participação cidadã alargada, uma base material sólida e a correspondente responsabilização política, cível e criminal. E, claro, um tempo certo e limitado, de exercício do poder, qualquer poder, político.
Há um tempo certo, se o tempo é o que dele fazemos ? 
 
In Notícias de Loures, Novembro 2015