10.4.07

Absurditate


Usar a versão latina de absurdidade, não acrescenta nada ao tema, mas sempre trará ao artigo uma dimensão erudita, rasgando o pato-bravismo militante que está na origem do escrito.

Ocorre que, por circunstâncias pessoais, me desloquei recentemente várias vezes ao Norte do país, a última das quais por vários dias. Tive nesta última oportunidade, a possibilidade de confirmar atentamente aquilo que havia ficado apenas como vaga, mas insistente, impressão das curtíssimas estadias anteriores:

Metade do país construído está à venda e a metade livre de construção está a ser construído. Ou seja, na minha modesta opinião, continuamos um país de patos-bravos. Talvez não já daqueles que enxamearam o país de bairros e casas clandestinas nos anos 60 e 70 passados, talvez uns patos-bravos mais finos, mais legais e até de gostos arquitectónicos mais aprazíveis. De todo o modo, patos-bravos sem dúvida.

Dizem os nossos sapientes economistas e doutos analistas que, ao contrário do passado, a construção civil já não é, nem pode ser, o motor da economia. Mas constrói-se que é um fartote. Quem é que me explica este fenómeno ?

Diz-nos o atentíssimo governo (vide o Quadro de Referência Estratégico Nacional 2007 – 2013) que “no que diz respeito ao Tema Valorização do Território o QREN estabeleceu a prioridade de dotar o país e as suas regiões e sub-regiões de melhores condições de atractividade para o investimento produtivo e de melhores condições de vida para as populações, abrangendo as intervenções de natureza infra-estrutural e de dotação de equipamentos essenciais à qualificação dos territórios e ao reforço da coesão económica, social e territorial

Isto porque o diagnóstico que faz e apresenta é do seguinte quilate: “Em matéria de desenvolvimento urbano e rural: expansão desordenada das áreas metropolitanas e de outras áreas urbanas, invadindo e fragmentando os espaços abertos, afectando a sua qualidade e potencial ecológico, paisagístico e produtivo, e dificultando e encarecendo o desenvolvimento das infra-estruturas e a prestação dos serviços colectivos; despovoamento e fragilização demográfica e socioeconómica de vastas áreas e insuficiente desenvolvimento dos sistemas urbanos não metropolitanos e da sua articulação com os espaços rurais envolventes, enfraquecendo a competitividade e a coesão territorial do país; degradação da qualidade de muitas áreas residenciais, sobretudo nas periferias e nos centros históricos das cidades, e persistência de importantes segmentos de população sem acesso condigno à habitação, agravando as disparidades sociais intra-urbanas; Insuficiência das políticas públicas e da cultura cívica no acolhimento e integração dos imigrantes, acentuando a segregação espacial e a exclusão social nas áreas urbanas.”

O diagnóstico, parece-me irrefutável; as prioridades do Governo, tímidas e embrulhadas em paleio que pode querer dizer tudo mas não significa nada; a realidade, é a insofismável certeza de que é tão elevado o número de habitações devolutas, de habitações em construção e das licenças para construir em cada ano que nem que regressassem os velhos machos latinos produtores de filhos em vasta prole, tais casas seriam completamente ocupadas nos próximos 50 anos.

Porque prossegue esta absurditate ?